2 de junho de 2010



RENASCIMENTO: CONTRADIÇÕES E AMBIGUIDADES




Estamos habituados a reconhecer e identificar o período caracterizado como Renascimento como uma época de importante mudanças e bruscas rupturas em relação à Idade Média, considerada como sua antítese. Parte deste pensamento, se deve a idéias por muito tempo disseminadas na própria historiografia e principalmente nos livros didáticos, que até pouco tempo atrás representavam a Idade Média como a época das trevas , ou como os longos mil anos de escuridão que pairaram sobre a Europa, e o Renascimento como o período de ascensão do homem , do pensamento livre de influências religiosas e místicas, da formação da ciência.


É claro que tais denominações fazem sentido, porém são por demais generalizantes e práticas. É como se logo que a Idade Média tivesse acabado (o que também é de difícil definição, não há como delimitar esses términos e inícios de forma linear , estipulando datas e fatos) o pensamento, cultura e imaginário característicos deste tivessem acabado junto, e o Renascimento em ascensão seria um novo tempo sem nenhuma influência ou resquício da época anterior.




Não podemos negar que foi durante o Renascimento que teve início a formação de um campo científico tal como o conhecemos hoje, baseado no empirismo e num dito racionalismo. Porém, essas novas experiências e descobertas ainda eram motivadas por sentimentos de religiosidade , aconteciam para explicar e legitimar fenômenos religiosos. É possível perceber através da Literatura da época e, principalmente nos textos de viajantes, aventureiros e descobridores , que o desconhecido ainda era explicado através da imaginação e da fantasia, lendas e mitos ainda faziam parte do cotidiano, como ainda fazem, mas estes ainda competiam pelo espaço de explicação correta, pelo estatuto de verdade. Os estudos gregros, mantidos pelos romanos nos campos da ciência e da geografia, durante a Idade Média foram substituídos por explicações religiosas impregnadas de mitologia e fantasia. Tais explicações faziam parte do real e do cotidiano, e faziam às vezes de ciência, ainda durante o Renascimento. Os estudos de Giordano Bruno , de Copérnico e o Pantagruel, de Rabelais, estavam impregnados de misticismo.

Nestas obras literárias e nos livros de classificação zoólogica e nos manuais de descrição do mundo animal e dos seres fantásticos, denominados bestiários, notamos a ambiguidade da Renascença, porém é dentro desta ambiguidade que se dá o início da formação de campos intelectuais independentes e distintos, na religião, na ciência e também na literatura.



Amanda Cieslak


1 comentários:

Caolho disse...

Realmente Amanda fico feliz de ver a sua produção no blog. Como complemento para suas colocações de fato ainda persiste esta forma de pensar em nossos dias e não somente nos livros didáticos. Na arte ainda existe esse paradigma quando se usa fronteiras claramente demarcadas entre medievo e o pensamento renascentista. "A pintura renascentista..." " A escultura medieval" ainda são comuns em certos autores. Outro fato é a existência de nossa interpretação de acordo com a apropriação do século das luzes sobre a cultura clássica, contribuindo para olharmos para a literatura medieval como uma distância ou mesmo com um olhar inferior. De fato,o pensamento neoclassicista parece durar mesmo numa modernidade tardia. Olhamos para nossos casarões da república como nossa herança passada, da mesma maneira como os burgueses olharam para cultura clássica para se distanciarem do mito de origem feudal da aristocracia.
Não olhamos para esses contextos como se eles não fossem ainda claramente definidos, como nosso presente o é. Como apontou sobre os navegadores, até o século XVII de muito o pensamento medieval era existente.Quando observamos galerias de arte que possuem artistas medievais e renascentistas, mesmo num período dito renascentista ainda detinham para si uma mentalidade medieval e representando-as em suas obras não necessariamente como o barroco, que usamos muito para trabalhar o meio de campo entre renascimento e medievo. Por outro lado é inegável dizer que existe fatores suficientes sobre as diferenças entre um e outro, por exemplo a contestação do domínio da igreja e outras formas de manifestação religiosa; o desenvolvimento da ciência (mas diferente daquela que vemos no XIX), o contato marcante com o novo mundo; o ressurgimento das cidades entre outros.
Dos meus pitacos, apenas fico com grande admiração do projeto de vocês e espero que continuem publicando cada vez mais coisas interessantes, impulsionando reflexões como as minhas neste breve comentário.