12 de janeiro de 2010

AVATAR, de James Cameron


O sucesso do filme Avatar, já chamado de “romantismo idiota” por Luiz Felipe Ponde, em crítica do dia 28 de dezembro de 2009, na Folha de São Paulo, é compreensível. Trata-se de uma superprodução com todos os elementos grandiosos que arrastam multidões aos cinemas contemporâneos: oposição simplista entre o bem e o mal, um herói dividido entre o interesse e a honra, o amor dificultado pelo fato de os amantes pertencerem a espécies diferentes, entre outros clichês que, quando bem tratados, realmente são deliciosos.

Mas há algo mais, uma certa inquietação criada por uma potencialidade real. E se imaginarmos possível que um paraplégico construa para si, por meio da mais alta tecnologia biológica, um corpo perfeito e saudável? Isso nos leva ao mote mais criativo do filme: para enfrentar o planeta Pandora, seus perigos e seus nativos, os humanos, altamente desenvolvidos no plano da ciência e da técnica, criam em laboratório o que se chama aí de “avatar”, corpos compostos pelo DNA dos nativos do planeta Pandora combinado com DNA humano. É, eu sei, é de arrepiar. Para esses corpos perfeitos, ágeis e fortes, é transportada a consciência dos humanos, que a partir daí estarão prontos a entrar em Pandora e buscar, ora um acordo comercial – há uma riqueza mineral sob o solo de Pandora que muito interessa aos humanos – ora a promoção de um massacre necessário para que a coisa toda saia mais fácil.

Estamos realmente diante de um enredo altamente pós-colonial. Entendendo pós-colonial como um conceito capaz de dar conta das narrativas em que os colonizadores se dão mal. Como os nativos de Pandora são super gente boa, antenadíssimos com a natureza e sua misteriosa força do bem, é claro que os humanos malvados serão expulsos pelos nativos, mas só depois de alguns humanos, esses do bem, cederem sua inteligência e sagacidade à causa nativa. Tudo isso se dará por meio da moralidade do amor, pois o herói, Jake Sully, vai se apaixonar pela nativa que o salva de um primeiro ataque das feras de Pandora e, penalizada, o leva até seu pai, o chefe da tribo local (temos aí uma relação intertextual inegável com o romance Iracema, de José de Alencar). Creio que o roteirista do filme é um usuário do site estante virtual, portanto pôde adquirir o clássico brasileiro facilmente e nele se inspirar.

Disso tudo concluímos que a natureza é boa, a maioria dos humanos é má, muito má, embora alguns sejam bons, e os habitantes de outros planetas são bons também, desde que nesses planetas se manifeste a força da natureza que, pelo visto, é interplanetária.

Mas voltemos à inquietação citada acima, o mote de “avatar” é a possibilidade de abandonar o corpo falho e fraco e criar um outro, maior, mais saudável, mais forte e mais bonito. O transporte para esse corpo se dá por escolha consciente, o que nos afasta de Matrix... A literatura e o cinema sempre nos deram a possibilidade de subir sempre e novamente ao cavalo magro de D’Artagnan e irmo-nos às aventuras, mas em Avatar a proposta é literal e há um ladinho da nossa mente que fica pensando que com toda essa tecnologia que há por aí talvez isso seja mesmo possível em breve! Claro, se a indústria estética, não a artística, não se apropriar antes dessa tecnologia para resolver problemas de celulite e gorduras localizadas.


Silvana Oliveira


1 comentários:

Unknown disse...

Grande Silvana... muito bom hein?
Avatar é um belo convite a devaneios, quem sabe possiveis, e deliciosos.