15 de novembro de 2010


O Visitante

Este filme, do diretor Thomas MacCarthy, foi feito em 2007 (EUA) e estreou no Brasil em 2009. Aqui foi mantido o mesmo título do original em inglês – The Visitor. A temática alude claramente ao clima pós 11 de setembro, opondo a forte presença de imigrantes nos EUA a um certo espectro de identidade americana já ultrapassada. O título é uma alusão ao protagonista, um professor universitário de 60 anos, Walter Vale (Richard Jenkins, em atuação memorável), que leciona em Connecticut e é um estranho no ambiente em que trabalha. Não tem interesse pelos seus colegas de departamento, nem pelos alunos, menos ainda pelo programa da disciplina que leciona há mais de 20 anos. Sua única manifestação de envolvimento pessoal é o esforço em aprender a tocar piano, habilidade da mulher falecida já há anos. Mas mesmo isso é um exercício de frustração, ele não aprende, não tem vocação, os professores de música são detestáveis.
No meio desse limbo – que não deixa de ser a dicção de certo modo de o ambiente acadêmico acontecer – Valter recebe uma incumbência: ir a um Congresso em Nova York para apresentar um trabalho que fez em co-autoria com uma colega de departamento. Valter na verdade não é autor de nada, apenas “emprestou” o nome para uma colega em começo de carreira, a moça está grávida, não pode viajar e Valter é “convocado” pela Universidade para apresentar o artigo. Ele não quer ir, mas se esforça e vai, na mesma cadência do tédio e marasmo de todas as suas horas. Sua condição de “visitante” concretiza-se na relação com a cidade de Nova York.
Ao chegar ao apartamento que mantém vazio em Nova York, Valter se depara com um casal de jovens imigrantes alojados ali: um sírio, Tarek (Haaz Sleiman) , e a namorada Zainab (Danai Gurfira), senegalesa. O casal percebe que alugara o apartamento de algum golpista local que se aproveitou do fato de Valter nunca vir à cidade. Concordam em deixar o apartamento, mas no último momento Valter se comove e os deixa ficar.
O contato entre os três, apesar das desconfianças mútuas, vai se estreitando. Valter começa a aprender a tocar tambor africano com Tarek. Este último é um fenômeno de graça e carisma, de que a música faz parte.É muito interessante como o filme contrapõe o clima insosso e impessoal do congresso ao contato humano e intenso que Valter passa a ter com Tarek e com a cidade de Nova York. Ambos tocam tambor no Central Park, em uma cena belíssima, da qual participam várias nacionalidades, tornando o centro do parque uma festa multiétnica.
No curto período da estada de Valter na cidade, Tarek é detido por um pequeno mal entendido no metrô – sempre o metrô – e sua condição de imigrante ilegal vem à tona. A partir daí, Valter passa a buscar meios de libertar o amigo.Nesta ponta da história chega à cidade a mãe de Tarek, uma imigrante síria que vive em Michigan e estranha a falta dos telefonemas diários do filho. É uma mulher bonita, de uma suavidade encantadora. Neste ponto do filme, a vida de Valter tem muito mais sentido entre essas pessoas que ele conheceu há pouco mais de 10 dias do que em Connecticut, com as aulas e a casa vazia. Na relação com Moluna (Hiam Abbas), a mãe de Tarek, vemos um Valter diferente, interessado na cidade, nos passeios que Zainab propõe de forma a Moluna conhecer a cidade como Tarek a conhecia.
Tarek acaba sendo deportado e sua mãe também retorna à Síria para ficar próxima do filho. O afeto que vinha se manifestando entre o casal Valter e Moluna é suspenso pelo imperativo da separação: a cena da despedida no aeroporto é antológica, de uma elegância rara no cinema americano.
A cidade de Nova York aparece de uma forma original neste filme. O passeio pelo rio Hudson, a vista da estátua da Liberdade, as estações do metrô, mesmo o vazio das torres gêmeas, tudo é mostrado como que pelos olhos de quem não é da cidade: Tarek, Zainab, mas também Valter, que havia morado ali há alguns anos, mas nunca tinha efetivamente “visto” esta Nova York.
A cidade que as personagens compartilham é outra, é a cidade que o encontro entre elas faz existir. Nesse sentido, vemos nesse filme a cidade cosmopolita que dizem ser Nova York, na qual podemos circular sem que a noção de sermos “de fora” nos alheie ou expulse.
Silvana Oliveira

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