7 de novembro de 2010

Selvagens, bárbaros e canibais


Normalmente, quando algum assunto relacionado aos indígenas vem à tona, estereótipos e imagens simplistas surgem, tais como nudez, selvagens, canibais, poligamia, etc. como que se dessem conta de explicar a totalidade e diversidade das práticas dos nativos.
Para que tal cenário seja compreendido se faz necessário entender o contexto em que foram criadas tais imagens. Durante a colonização do território brasileiro, no século XVI, dois universos culturais totalmente dissonantes travaram encontro. Um deles representado pelas diversas tribos que habitavam o Brasil quando da chegada dos europeus, e o segundo pelos colonizadores (entre eles pode-se citar os viajantes, os religiosos, os colonos, os aventureiros) europeus.
Além do desejo de conquista, enriquecimento e novas descobertas a relação que o colonizador português demonstrou manter com uma ação evangelizadora é primordial. Ao assumirem para si a postura e a identidade de evangelizadores, sendo assim responsáveis pela disseminação do catolicismo e pelo fortalecimento do reino, estes homens viram sua ação justificada e legitimada, possibilitando que atuassem perante o Novo Mundo e seus habitantes conforme acreditavam ser o correto.
E este correto era pautado conforme os referenciais europeus, que no século XVI, vivia a Reforma e a Contra–Reforma, a inquisição, a disseminação da figura da bruxa, o medo do purgatório e dos castigos do inferno e ao mesmo tempo o florescimento do Renascimento, das novas descobertas e da formação de campos científicos. Assim, o colonizador era um homem desejoso de novas descobertas, de aventuras e conhecimentos, mas que ainda pautava suas ações pela imaginação, religiosidade e fantasia.
Dessa maneira, quando este chegou ao Brasil passou a classificar e a representar os nativos conformes seus referenciais de mundo, em uma tentativa de tradução da cultura indígena. Tais descrições são encontradas na chamada Literatura de Informação e Literatura Jesuítica. São exemplos de cronistas o Padre Fernão Cardim e Simão de Vasconcelos, e Pero Vaz de Caminha com sua famosa carta do descobrimento.
Nestas descrições encontram-se relatos de barbarismo, selvageria, feitiçaria, desregramento, nudez, etc. O nativo brasileiro não foi percebido a partir de sua própria cultura, até porque os colonizadores não a reconheciam, mas sim conforme a cultura e significações de mundo próprios da Europa.
Essa transposição cultural européia para o entendimento do universo nativo gerou um distanciamento, um abismo. Mesmo que se reconheçam as trocas culturais e a rede de relações que se deram entre colonizadores e colonizados, a particularidade das culturas nativas não foram reconhecidas. A Colônia e seus habitantes não significaram então a distinção e o respeito ao outro, mas sim a projeção de si mesmo.

Amanda Cieslak.

0 comentários: